Prosimetron

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terça-feira, 15 de setembro de 2009

Almodóvar e os Abraços Desfeitos

Ao contrário de alguns jovens realizadores contemporâneos, que fazem questão de revelar a sua pouca cultura cinematográfica, Pedro Almodóvar é um cineasta-cinéfilo. Viu muitos filmes e vibrou com eles, como se tem notado em toda a sua obra e não é desmentido por Abraços Desfeitos. São várias as homenagens, tanto explícitas como implícitas. Da primeira categoria, temos desde logo as imagens de Viaggio in Italia, de Roberto Rossellini, com uma Ingrid Bergman em estado de graça; e o plano em que Ernesto Filho filma Mateo Blanco/Harry Caine com uma câmara assente num tripé e um rosto ameaçador remetendo, como o próprio Ernesto Filho o diz, para uma das obras-primas de Michael Powell, Peeping Tom.
Implicitamente, temos a matriz de tantos melodramas clássicos, especialmente os de Douglas Sirk. Foi neste cineasta, rei incontestado dos melodramas, que pensei quando vi um protagonista cego, e cego devido a um adultério castigado. Mas, como noutros seus filmes, é o tragicómico que domina este filme- é a comicidade genial de Almodóvar ( o cameo fabuloso de uma das divas de Almodóvar, Rossy de Palma- a do nariz protuberante, a história da mala ou o guião para um filme de vampiros ) que alivia a tensão dramática desta história de amores obsessivos.
Voltando ainda ao cinema, importa dizer que é pela televisão que acedemos a algumas das referências fílmicas, já que é no televisor da casa de Harry que vemos Ingrid Bergman e aquele ouve pela primeira vez o seu filme mutilado. Omnipresentes também os dvd, hoje em dia repositórios da memória do cinema e da memória pessoal- Harry a pedir a Diego para ouvir a voz de Jeanne Moreau...

4 comentários:

MR disse...

Viagem em Itália (mais em Nápoles) é um dos meus filmes.

Anónimo disse...

Filmes da"minha vida"tenho 2:" 8 e 1/2",do Fellini,e do Rosselini,"A tomada do poder por Luis XIV". Por outras palavras:o barroco e o clássico. Ou ainda: o excesso e a escassez. Obrigado,Luis Barata,por lembrar Rosselini.É evidente que Almodover é o excesso. Os extremos,muitas vezes,tocam-se.
Alberto Soares.

Anónimo disse...

No comentário anterior,onde se lê"Almodover" deve ler-se Almodovar.
Alberto Soares.

LUIS BARATA disse...

Caro Alberto Soares: "La prise de pouvoir" também é um filme de que gosto muito. Vi-o pela primeira vez ainda adolescente e não tenho dúvidas de que exerceu grande influência no meu interesse tanto pelo "Siécle de LouisXIV" e o que lhe está associado ( de Versalhes a Saint-Simon ) como pelos mecanismos do poder, no caso a formação do Absolutismo com um soberano que decide governar dispensando até um primeiro-ministro ( embora tenha feito boas escolhas de ministros como Colbert )e que eleva a representação e a simbólica do poder a outros patamares.